III
Nesse ambiente social em que intelectuais não tinham voz ativa (quanto mais a população?), o discurso da ciência, positivista ou naturalista, forneceria a chave para a construção do país. A imagem é da socióloga e historiadora Simone Petraglia Kropf: "Erigia-se a crença ilimitada no poder da ciência como chave para a promoção de um saber objetivo e eficaz sobre a realidade, um conhecimento tido como infalível no sentido de apontar os caminhos seguros para o bem-estar moral e material da sociedade".
Ao lado da intervenção médica, o trabalho da engenharia desenvolvia também um papel de estruturação da nação, como louvou em 1888 o engenheiro Antônio Paula de Freitas, em solenidade referente aos 25 anos de criação do Instituto Politécnico Brasileiro: "Lançai vossas vistas sobre a extensa região do Brasil: comparai o que foi, o que é atualmente, ou tende a sê-lo; encontrareis por toda a parte o dedo do engenheiro, e reconhecereis que temos ganho não somente na civilização como no progresso nacional, e que toda essa evolução, única crescente e realmente eficaz, é fruto da engenharia nacional".
É o clima que permite às autoridades, por exemplo, o poder de intervenção no ambiente privado da população, como ocorreu com a imposição da obrigatoriedade das campanhas de vacinação. A Revolta da Vacina, por exemplo, de 1905, não era só um resquício de atraso por parte da população, foi uma reação a uma série de medidas autoritárias (desapropriações, exílios) que estourou quando os batalhões de sanitaristas de Oswaldo Cruz começaram a entrar nas casas das pessoas para lhes aplicar obrigatoriamente uma dose de vacina.
De novo, Sevcenko: "Foi, aliás, esse mesmo temor de uma manipulação arbitrária, que se impunha pela pretendida autoridade científica, sem qualquer consideração pela humanidade do paciente, que motivou a rebelião popular na violenta Revolta da Vacina".
Voltando à nossa polêmica, Saturnino de Brito não era um louco interventor, seguia a cultura política do Estado em relação às questões sanitárias e, assim como os batalhões de sanitaristas nas residências, não viu obstáculos em marcar com ferro e cimento os terrenos públicos ou privados por onde passariam as ruas e avenidas que havia projetado em sua planta.